sexta-feira, 22 de maio de 2009

ESTÉTICA DO CONSUMO

A QUESTÃO DO BELO DEVE SER ANALISADA SOB VÁRIOS PARÂMETROS,ENTRE ELES O CONCEITO GREGO.O DIRECIONAMENTO HISTÓRICO E FILOSÓFICOS SÃO BASES PARA CRIAR NOVOS POSICIONAMENTOS E CONCEITOS.

A estética e o tempo
Em edição luxuosa, Umberto Eco percorre a História da Beleza
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ANTIGUIDADE Busto Feminino, do século II a.C.
Nas últimas linhas da luxuosa edição História da Beleza, após 400 páginas de idéias, textos históricos, análises e ilustrações, o professor, estudioso e escritor italiano Umberto Eco chega a uma conclusão. Falando de um hipotético explorador do futuro que voltasse ao recém-encerrado século XX para descobrir o que era considerado belo em nosso tempo, Eco declara: ''(o explorador) Será obrigado a render-se diante da orgia de tolerância, de sincretismo total, de absoluto e irrefreável politeísmo da Beleza''.
É assim mesmo, com letra maiúscula, que o escritor - catedrático da Universidade de Bolonha, mais conhecido por romances como O Nome da Rosa - refere-se a seu objeto de estudo. A reverência com que aborda o tema fica clara ao longo deste lançamento. Mas o que realmente cativa o leitor é a erudição de Eco, qualidade que fica evidente sem que o autor soe, em nenhum momento, pedante. Antes de chegar ao século XX, Eco passeia por Grécia e Roma antigas, pela Idade Média, pelo Renascimento, pela estética vitoriana do século XIX. Ele se apóia em textos de Platão a Eric Hobsbawm, passando por Dante, Kant, Hegel e Kafka, e reproduz trechos destes e de muitos outros autores. Trata-se de uma viagem pela história do homem, da arte e, sobretudo, do olhar.
Apesar de ser repleto de reproduções de quadros e esculturas, História da Beleza não é um livro sobre Arte. Quem faz a ressalva é o próprio Eco. ''É uma história da Beleza e não uma história da arte (ou da literatura ou da música), logo, só serão citadas as idéias expressas no decorrer do tempo sobre a arte quando relacionarem Arte com Beleza'', escreve. Mas o próprio Eco admite que a arte sempre foi - e é no livro também - o principal meio de documentação da beleza, porque foram ''artistas, poetas, romancistas que nos contaram através dos séculos o que eles consideravam belo e que nos deixaram seus exemplos''.
DAMAS Leonardo da Vinci pintava figuras femininas fugidias, como no Retrato de Cecilia Gallerani
De qualquer forma, neste volume os exemplos do que foi e é considerado belo vão além das pinturas: a análise se estende à arquitetura, às fotografias do cotidiano, à publicidade, à moda. O livro começa com linhas do tempo ilustradas, mostrando como figuras ligadas à beleza (Vênus, Jesus Cristo, Maria, reis e rainhas) foram representadas de formas diferentes ao longo dos séculos. No caso da Vênus, a linha começa com uma estatueta de uma mulher do 30º milênio a.C. e termina com uma foto da atriz italiana Monica Bellucci nua, feita para o Calendário Pirelli de 1997. Nesse intervalo, relata Eco, muitas coisas mudaram - e algumas até permaneceram iguais.
A idéia da beleza feita de proporções ideais, por exemplo, permeia todo o livro. Da chamada ''Beleza grega'', presente nas estátuas dos séculos anteriores à Era Cristã (e retomada pelos homens da Renascença), passando pelos pitagóricos da Idade Média (que aplicaram proporções matemáticas para determinar os intervalos entre as notas musicais) e chegando a nossos dias, relações de geometria e matemática sempre demarcaram preferências estéticas. Há, porém, um detalhe determinante: os padrões se alteraram ao longo dos tempos. ''Parece que em todos os séculos se falou da Beleza da proporção, mas que segundo as épocas, apesar dos princípios aritméticos e geométricos declarados, o sentido dessa proporção foi mudando'', diz Eco.
Graças ao texto fluido e à vasta instrução do autor, todos os períodos retratados na obra (escrita em ordem cronológica e dividida também por temas como ''a religião da Beleza'' ou ''a Beleza cruel e tenebrosa'' dos pesadelos, do sofrimento e da violência) são interessantes. Mas, talvez pela proximidade cronológica ou pela vocação para a contradição, o século XX é mais atraente. Eco esquadrinha temas como a estética do consumo (a beleza atrelada ao valor comercial dos produtos), o ''socialismo utópico'' das construções arquitetônicas, o triunfo da função sobre a forma - e a subversão de tudo isso, em movimentos de vanguarda como o dadaísmo ou na ironia da pop art. Antes de chegar aí, História da Beleza percorre um longo, rico e fascinante caminho. É um prazer percorrê-lo.